O sabor, a textura e a versatilidade, mas também a história e seu encanto, fazem do chocolate uma paixão mundial que vem desde os tempos mais antigos: os maias por exemplo consideravam o chocolate (bebida de cacau preparada com água quente) o “Alimento dos Deuses”.
De lá para cá, muita coisa mudou, e os processos industriais adicionaram pelo menos dois ingredientes ao cacau: gordura e açúcar. Surgiram também versões brancas do chocolate sem a massa de cacau e contando apenas com a manteiga do fruto, juntamente com leite em pó e açúcar. Para não ter erro: quando falamos em benefícios do chocolate nos referimos à constituição da massa do cacau (de cor escura), portanto quanto maior o percentual dele no chocolate, mais saudável o é alimento e também mais escuro e amargo. Para se ter uma ideia, uma revisão recente publicada no final de 2019 no International Journal of Environmental Research and Public Health enumera oito benefícios dos chocolates mais amargos.
O cacau, ingrediente básico do chocolate, contém uma quantidade significativa de gorduras boas (40-50% em manteiga de cacau, com aproximadamente 33% de ácido oleico, 25% de ácido palmítico e 33% de ácido esteárico). Ele também contém polifenóis, que constituem cerca de 10% do peso seco de um feijão inteiro. O cacau é uma das principais fontes de polifenóis na dieta ocidental, contendo mais compostos fenólicos do que a maioria dos alimentos. Três grupos de flavonoides podem ser identificados nos grãos de cacau: catequinas (37%), antocianidinas (4%) e proantocianidinas (58%); essas substâncias são os fitonutrientes mais abundantes no cacau e responsáveis por seus benefícios com relacionados às ações anti-inflamatória, antioxidante e vasculotônica.
Seria ótimo se o nosso paladar fosse educado ao cacau 100%. No entanto, a amargura causada pelos polifenóis torna os grãos de cacau não processados bastante desagradáveis. Os fabricantes, portanto, desenvolveram técnicas de processamento para eliminar o amargor, criando chocolates com menor teor de cacau (ao leite, com oleaginosas, meio amargo e o branco). Tais processos reduzem o conteúdo de polifenóis em até 10 vezes: para os consumidores, o produto é marcadamente diferente, principalmente devido ao baixo teor de polifenóis e às outras substâncias adicionadas durante a fase de processamento (por exemplo, açúcar e emulsificantes como lecitina de soja). Os polifenóis estão associados aos efeitos benéficos; portanto, o cacau e o chocolate amargo (aquele que traz o cacau como primeiro item da lista de ingredientes no verso da embalagem) assumiram importância significativa e podem ser adicionados ao hábito alimentar com efeitos nutritivos e funcionais. Abaixo, 10 motivos relacionados à saúde para consumir o chocolate amargo:
- Efeitos cardiovasculares – Uma série de benefícios para o sistema cardiovascular pode ocorrer após a ingestão regular de alimentos e bebidas que contenham cacau. Esses benefícios têm forte relação com a presença dos flavonoides, que são anti-inflamatórios e antioxidantes. O uso regular de chocolate pode estar associado a um risco cardiovascular reduzido e a sugestão e dose adequada para consumo de chocolate foi de 45g por semana, uma vez que níveis mais altos podem contrariar os benefícios à saúde devido a efeitos adversos associado ao consumo elevado de açúcar.
- Antidiabético – Os componentes do cacau oferecem importante ação como agentes antidiabéticos, especialmente com diabetes mellitus tipo 2 (T2D). O cacau e seus flavonóis melhoram a homeostase da glicose, retardando a digestão e absorção de carboidratos no intestino.
- Contra obesidade – Recentemente, estudos investigaram os efeitos preventivos ou terapêuticos do cacau e de seus constituintes contra a obesidade e a síndrome metabólica. Na revisão desses relatos, os autores citam estudos que observaram uma redução na expressão de vários genes associados ao metabolismo e armazenamento de gorduras, além de aumentar a expressão de genes associados à termogênese.
- Melhora da microbiota intestinal – Nos últimos anos, há um interesse crescente nos estudos da microbiota intestinal e suas alterações como resultado dos hábitos alimentares. O intestino humano hospeda a microbiota intestinal, uma enorme coleção de microrganismos com papel fundamental no armazenamento de energia e distúrbios metabólicos. Em um estudo de intervenção humana, projetado para investigar a influência da alta ingestão de flavonoides de cacau no crescimento da microbiota fecal humana, os autores avaliaram que a ingestão de 494 mg de flavonoides de cacau/dia por quatro semanas teve um efeito significativo no desenvolvimento da microbiota intestinal.
- Um ‘up’ para o sistema imunológico – Estudos in vivo e in vitro mostraram que o cacau possui propriedades regulatórias nas células imunes implicadas na imunidade inata e adquirida.
- Benefícios ao Sistema Nervoso Central – Existem evidências de algum fator benéfico no sistema nervoso central. Os polifenóis do chocolate preto podem atuar no sistema nervoso central (SNC) e nas funções neurológicas através da liberação de óxido nítrico, responsável pela vasodilatação e aumento do fluxo sanguíneo cerebral que fornece oxigênio e glicose aos neurônios, levando ao aumento na formação e manutenção de vasos sanguíneos no hipocampo. Além disso, o potencial antioxidante dependente do polifenol pode contribuir para a melhora de alguns distúrbios neurodegenerativos.
- Estímulo à felicidade – Segundo estudos, a ingestão de chocolate está ligada também a aspectos emocionais, ao aumentar a síntese cerebral de serotonina, o famoso hormônio da felicidade e que produz uma sensação de energia e prazer. Mas é necessário ter cautela no consumo de chocolates com teor maior de açúcar, uma vez que os carboidratos também estão envolvidos nesse processo em um primeiro momento, mas seu excesso também pode causar distúrbios metabólicos e elevar a sensação de culpa.
- Poder sobre aspectos sexuais – O chocolate exerce vários efeitos sobre a sexualidade humana, atuando principalmente como afrodisíaco. O cacau em pó e o chocolate contêm substâncias que, em conjunto com outros componentes do chocolate (como cafeína e teobromina), produzem uma sensação transitória de bem-estar.
- Prevenção da anemia – Rico em ferro, o cacau pode ajudar a prevenir a anemia. O ferro é essencial para a formação da hemoglobina, que é um componente das hemácias responsável pelo transporte de oxigênio para o organismo e que normalmente está em menores quantidades em caso de anemia. Enquanto 100g de cacau contam com 13,9 mg de ferro, cada 100g de feijão, geralmente citado como uma boa fonte desse mineral, possui 5,1mg.
- Efeito anti-idade na pele – O chocolate amargo não causa espinhas, ao contrário do que muitos acreditam. Devido à alta concentração de cacau em sua fórmula, o chocolate amargo é, na verdade, um aliado da saúde da pele, pois suas propriedades antioxidantes e anti-inflamatórias ajudam a conferir luminosidade e hidratação ao tecido cutâneo, além de auxiliarem na proteção aos danos dos raios UV, prevenirem rugas e combaterem os radicais livres.
Mas atenção! Mesmo que você opte pelo chocolate amargo é importante tomar cuidado com o consumo excessivo, pois, independentemente da concentração de cacau, o chocolate ainda tem açúcar e gorduras saturadas.
*DRA. MARCELLA GARCEZ: Médica Nutróloga, Mestre em Ciências da Saúde pela Escola de Medicina da PUCPR, Diretora da Associação Brasileira de Nutrologia e Docente do Curso Nacional de Nutrologia da ABRAN. A médica é Membro da Câmara Técnica de Nutrologia do CRMPR, Coordenadora da Liga Acadêmica de Nutrologia do Paraná e Pesquisadora em Suplementos Alimentares no Serviço de Nutrologiado Hospital do Servidor Público de São Paulo.