O consumo de alimentos in natura é fundamental para aproveitarmos ao máximo os macronutrientes, além das vitaminas, minerais e antioxidantes. Mas muitos desses alimentos, como verduras, legumes, cereais, grãos e os processados de origem animal, contam com substâncias antinutricionais, que diminuem a absorção desses nutrientes e podem até causar problemas de saúde, além de afetarem o ganho de massa muscular e interferirem na redução do peso.
O termo antinutriente ou fator antinutricional tem sido usado para descrever compostos ou classes de compostos presentes numa extensa variedade de alimentos de origem vegetal. São elementos essenciais para a saúde dessas plantas alimentares, porém, quando consumidos, reduzem a biodisponibilidade de seus nutrientes. Eles interferem na digestibilidade, na absorção e utilização de nutrientes e, se ingeridos em altas concentrações, podem causar efeitos danosos à saúde, por exemplo, diminuindo a disponibilidade biológica de aminoácidos essenciais e minerais, além de provocar irritações e lesões da mucosa gastrointestinal, interferindo na seletividade e eficiência dos processos biológicos. Ao impactar na absorção de macro e micronutrientes, esses fatores antinutricionais, quando consumidos em excesso, ainda podem interferir no ganho de massa muscular, reduzir a absorção de proteínas e impactar na perda de peso.
Apesar de alguns antinutrientes serem encontrados em alimentos processados de origem animal, a maioria está presente em alimentos de origem vegetal “in natura”. Por isso, devem ser motivo de atenção para as pessoas que têm uma dieta baseada em plantas, com restrição de grupos alimentares ou com consumo monótono e excessivo de vegetais crus. Os principais antinutrientes para prestar atenção são:
*Polifenóis (Taninos): Presentes em vários alimentos de origem vegetal, principalmente vegetais folhosos e frutos como banana, caqui, uvas e frutas vermelhas, os taninos são considerados como antinutrientes entre os compostos fenólicos por causa de seu efeito adverso na digestibilidade das proteínas.
*Nitratos e Nitritos: As plantas são a principal fonte de nitratos, enquanto os produtos processados e curados são a principal fonte de nitritos. Estima-se que as hortaliças, em particular as verdes folhosas, contribuam com mais de 70% do nitrato total ingerido. Essas são substâncias que podem produzir efeito tóxico aos indivíduos, que podem ser severos ou não, dependendo da quantidade ingerida e da suscetibilidade do organismo.
*Oxalato: Frequentemente encontrado em vegetais, o oxalato não pode ser metabolizado pelos humanos e é excretado na urina. Cerca de 75% de todos os cálculos renais são compostos, principalmente, de oxalato de cálcio. O oxalato está presente em vários alimentos, incluindo espinafre, beterraba, cacau em pó, pimenta, sementes oleaginosas e cereais integrais.
*Fitatos: Encontrados principalmente em sementes e grãos, os fitatos são derivados do ácido fítico com habilidade de formar quelantes com minerais, gerando complexos resistentes à ação do trato intestinal que diminuem a disponibilidade e absorção de nutrientes como cálcio, magnésio, ferro e zinco. Além disso, interagem com proteínas e podem inibir enzimas digestivas como a pepsina, pancreatina e α-amilase e consequentemente reduzir a absorção de macro e micronutrientes.
*Inibidores de Proteases: Os inibidores de enzimas digestivas são encontrados com bastante frequência nos alimentos. Entre os mais conhecidos estão os inibidores de enzimas proteolíticas e amilolíticas, produzidas pelo pâncreas. Nas leguminosas, os inibidores de tripsina e lectinas são conhecidos como Aglutinina de Soja, que é resistente às enzimas digestivas e no trato gastrointestinal pode se ligar ao epitélio intestinal, afetando as vilosidades.
*Glicosídeos Cianogênicos: Nas plantas, o ácido cianídrico encontra-se ligado a carboidratos denominados de glicosídeos cianogênicos, sendo liberado após sua hidrólise (quando a molécula de água quebra a ligação química). São produtos do metabolismo das plantas e fazem parte de seu sistema de defesa contra herbívoros, insetos e moluscos. Dentre os glicosídeos cianogênicos encontrados naturalmente em alimentos estão: a amigdalina, presente nas sementes de frutos como a pera, maçã, pêssego e cereja; e a linamarina e lotaustralina, encontradas na mandioca e linhaça. O ácido cianídrico é o princípio tóxico, cuja ingestão representa sério perigo à saúde, podendo resultar em sintomas de intoxicação.
Entre os alimentos que mais concentram antinutrientes estão os cereais (aveia, arroz, trigo, milho, quinoa, amaranto) e as leguminosas (feijão, ervilha, soja, lentilha, grão de bico). Mas os encontramos também em legumes, vegetais folhosos, sementes, oleaginosas e frutos.
No entanto, apesar dos perigos que essas substâncias podem representar para o organismo, na maioria das vezes não há problemas no consumo de alimentos contendo esses compostos, pois o próprio processamento, como cozimento, maceração, uso da atmosfera controlada, tratamento térmico, trituração, descortiçamento de grãos, tratamento enzimático, alta pressão isostática, por exemplo, é capaz de eliminá-los parcial ou totalmente.
Estudos genéticos também têm sido realizados no desenvolvimento de variedades de vegetais com menor quantidade de determinados antinutrientes. O segredo é preparar o alimento corretamente, deixando feijão e outros grãos de molho e cozinhando adequadamente. É importante ressaltar que esses alimentos não devem deixar de ser consumidos, pois isso significaria não absorver vitaminas, proteínas, minerais e antioxidantes, nutrientes que são importantes para a saúde geral e a prevenção de doenças. Veganos, vegetarianos, pessoas com problemas renais e intestinais podem consultar um médico nutrólogo para adequação alimentar, minimizando os riscos.
FONTE: DRA. MARCELLA GARCEZ – Médica Nutróloga, Mestre em Ciências da Saúde pela Escola de Medicina da PUCPR, Diretora da Associação Brasileira de Nutrologia e Docente do Curso Nacional de Nutrologia da ABRAN. A médica é Membro da Câmara Técnica de Nutrologia do CRMPR, Coordenadora da Liga Acadêmica de Nutrologia do Paraná e Pesquisadora em Suplementos Alimentares no Serviço de Nutrologia do Hospital do Servidor Público de São Paulo. Além disso, é membro da Sociedade Brasileira de Medicina Estética e da Sociedade Brasileira para o Estudo do Envelhecimento. Instagram: @dra.marcellagarcez