Não há mais dúvidas: o futuro, cada vez mais presente, está na personalização. Um vinho criado especialmente para você. Uma dieta desenhada exclusivamente para sua necessidade nutricional. Um tratamento de saúde que seja mais eficaz particularmente para seu caso. Até mesmo aquele amor perfeito, sua metade da laranja que tanto procura, não será mais platônico. Entramos na era da genomização de produtos e serviços.
O fascínio pela ancestralidade deu à luz um boom de negócios especializados em DNA, criando uma nova geração de startups no segmento healthtech. Estima-se que esse mercado irá explodir de US$ 70 milhões em 2017 para US$ 340 milhões até 2022, de acordo com a Medical Device and Diagnostic Industry (MD+DI).
Quem diria que o projeto Genoma – iniciado em 1990 e finalizado em 2003 com o intuito de identificar e mapear nossos genes – nos levaria para muito além de meramente definir com precisão a filiação de uma pessoa? O conhecimento do mapa genético, tanto de humanos como demais espécies, vem permitindo avanços importantes em áreas como beleza, saúde, boa forma, bem-estar e até mesmo em relacionamentos.
Embora esse novo nicho ainda seja dominado por grandes corporações, como a AncestryDNA, que anunciou recentemente ter alcançado 4 milhões de usuários em seu banco de dados, ou ainda a 23andMe, que tem apoio do bilionário do Facebook Yuri Milner e da Google Ventures, novas startups genômicas estão surgindo a cada dia oferecendo uma grande variedade de produtos e serviços totalmente exclusivos, pois são desenvolvidos a partir da análise do DNA.
Essa nova onda de startups, é importante sublinhar, foi amplamente favorecida pela redução no custo de sequenciamento de DNA, o que permitiu que empresas nascentes conseguissem comercializar seus produtos para um público maior a um preço muito mais acessível.
Uma delas é a Helix, um spin-off da Illumina, grupo de San Diego considerado um dos mais ativos em genômica no mundo, de acordo com dados da CBInsights, e um dos grandes responsáveis por revolucionar o acesso ao DNA. A startup é uma usina de genes de mais de US$ 20 bilhões. Suas máquinas ajudaram a transformar a genômica numa ferramenta indispensável, usada para tratar doenças, prever respostas a medicamentos e identificar quais mutações genéticas aumentam nosso risco de doenças graves.
Por US$ 80, seus clientes encaminham amostras de saliva e têm acesso ao seu diversificado portfolio, que inclui desde o tipo de vinho ideal de acordo com sua sequência genética até um programa de condicionamento físico apropriado para seu biotipo. Ao todo, são 18 produtos personalizados e oferecidos a partir de uma pequena amostra genética.
A Helix foi a responsável por sequenciar o DNA de Steve Jobs pelo valor de US$ 100 mil na época. De acordo com o biógrafo do empresário, Walter Isaacson, o mapeamento forneceu informações sobre possíveis tratamentos e permitiu que os médicos personalizassem seu tratamento medicamentoso. Quase 7 anos após sua morte, esse mesmo tipo de sequenciamento está amplamente disponível e custa apenas alguns milhares de dólares – ou menos.
Atualmente, há basicamente três níveis de tecnologia disponíveis para decodificar o DNA humano. No topo, está o sequenciamento completo do genoma (o mesmo feito por Steve Jobs), um processo robusto que fornece um grande volume de informações. A genotipagem mais barata e mais utilizada é a que envolve o exame de um conjunto predeterminado de locais no genoma a partir dos quais se pode inferir ancestralidade, relações genéticas e alguns riscos de doenças.
No meio do caminho está o exoma sequenciamento, que geralmente custa menos de US$ 1 mil e fornece um retrato considerável da genética de uma pessoa, mapeando toda a região codificadora de proteínas do genoma humano. É esse tipo de sequenciamento – mais rápido e mais barato – que parte destas startups está conseguindo explorar comercialmente.
Outra startup de destaque nesta nova onda é a DNAFit. Idealizada por Avi Lasarrow, ela também oferece exercícios e dietas baseados em DNA com algumas diferenciações. Por meio do mapeamento, é possível ter acesso a informações sobre habilidades físicas e exercícios mais apropriados para cada indivíduo, quais alimentos precisam comer mais e quais devem ser evitados.
Para além do mercado de saúde e bem-estar, há também startups que desenvolveram produtos customizados, por exemplo, na área de gastronomia. A Exploragen é uma delas. A empresa lançou um mecanismo de recomendação de vinhos, o Vinome, que, baseado em pesquisas sobre a percepção de preferências a partir do DNA, mapeia o código genético e indica um perfil de sabor que aquela pessoa provavelmente vai gostar muito. Um vinho para chamar de seu.
E o que dizer da possibilidade de encontrar sua alma gêmea analisando a compatibilidade entre seus genes? Que Tinder que nada. A Instant Chemistry, uma startup baseada em Toronto e fundada por Ron Gonzalez em 2013, usa o mapeamento genético para proporcionar uma experiência mais legítima de combinação de interesses. Gonzalez explica que a “química” entre duas pessoas é baseada na biologia e na genética. Mais especificamente, estudos demonstram que as diferenças no sistema imunológico dos indivíduos podem fortalecer ou enfraquecer os níveis de atração.
Não poderia ter personificação melhor da figura de um cupido para o século XXI, não é mesmo?
Ao aplicar o teste de DNA e uma avaliação psicológica, a Instant Chemistry examina três aspectos da compatibilidade de relacionamentos: biocompatibilidade (ou genes complementares), neurocompatibilidade (ou química do cérebro e comportamento emocional) e compatibilidade psicológica (ou padrões comportamentais).
Com essa abordagem em três frentes, os casais aumentam as chances de fortalecer a compreensão do comportamento e da atração uns pelos outros, melhorando a base do relacionamento. Bem provável que veremos uma queda no número de divórcios nas próximas décadas.
Embora todo esse cenário pareça ainda bastante futurista, ele já é realidade. Os produtos já estão disponíveis no mercado e a preços cada vez mais acessíveis. As opções literalmente com a “nossa cara”, personalizadas ao extremo, devem se popularizar ainda mais nos próximos anos. E os principais beneficiados seremos nós mesmos, que, nesta tendência, iremos nos conectar melhor com nosso corpo, ser mais cuidadosos com nossa saúde e aprimorar nossa qualidade de vida seguindo nossa composição genética.
E você? Está pronto para fazer seu primeiro teste de DNA?
(*) Lima Santos é CEO da 5xmais Holding Business, empresa de investimento em startups